Considerada altamente transmissível e recentemente detectada no Brasil, a linhagem XBB.1.5 do coronavírus é mais uma sublinhagem da variante Ômicron do microrganismo.
Desde 11 de janeiro de 2020, quando o código genético do SARS-CoV-2 se tornou conhecido, ouvir falar sobre linhagens e variantes do coronavírus passou a fazer parte do dia a dia da população mundial. Ainda assim, muitas vezes é difícil compreender o que está por trás desses nomes difíceis e como eles impactam as nossas vidas.
Para esclarecer algumas das dúvidas mais comuns, a pesquisadora do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e uma das curadoras da plataforma GISAID (principal banco de dados genéticos do coronavírus), Paola Resende, respondeu perguntas sobre o tema.
Na entrevista, ela aborda a diferença entre linhagens e variantes, o que são variantes de preocupação e como podemos contribuir para reduzir as chances da emergência de novas variantes deste tipo. Confira a seguir:
Muito se fala de variante e linhagem, pode explicar a diferença?
São classificações dos vírus. Foi estabelecido um sistema, chamado de Pangolin, para padronizar a classificação do SARS-CoV-2, com base nas características genéticas, considerando a presença de mutações pontuais ao longo do genoma, que são compartilhadas por vários vírus e são consideradas como assinaturas genéticas. Já foram descritas mais de 2.500 linhagens do SARS-CoV-2. Entretanto, nem todas essas linhagens tiveram sucesso evolutivo. Nem todas conseguiram se dispersar por diferentes localidades ou diferentes países, e muitas delas já deixaram de circular. Hoje, apenas algumas dessas 2.500 linhagens circulam, porque o padrão é uma linhagem substituir a outra ao longo do tempo. Entre essas linhagens, algumas delas se destacam epidemiologicamente, pelo número de casos ou por terem mutações importantes ao longo do genoma. Para essas linhagens que se destacam, a Organização Mundial da Saúde (OMS) determinou um sistema de classificação de variantes, que são identificadas por letras gregas.
Todas as variantes são preocupantes?
Não. Todas as variantes são monitoradas, mas temos diferentes classificações de variantes, dependendo do impacto global ou regional. As variantes de preocupação são aquelas que se expandiram globalmente. As variantes Alfa, Beta, Delta e Gama circularam no passado. Atualmente, a Ômicron predomina em todo o mundo. Nós já tivemos também variantes de interesse, como foi o caso da Zeta no Brasil. Estas variantes foram monitoradas, mas tiveram impacto menor do que as variantes de preocupação e já deixaram de circular.
As variantes que têm surgido ultimamente são derivadas da Ômicron?
Sim, as variantes mais recentes são sublinhagens da Ômicron. Quando a Ômicron foi introduzida no Brasil, as sublinhagens predominantes eram BA.1 e BA.2. Ao longo do tempo, elas foram sendo substituídas por BA.4 e BA.5. Hoje, temos algumas linhagens que a Organização Mundial da Saúde classifica como subvariantes da Ômicron sob monitoramento, que devem ser acompanhadas com atenção porque podem ter maior impacto na circulação da Covid-19. Nesse grupo, temos, por exemplo, a subvariante XBB e suas linhagens, incluindo a XBB.1.5.
Quais as variantes e subvariantes mais frequentes no Brasil atualmente?
Todos os casos sequenciados no Brasil são da variante Ômicron. Entre as subvariantes, a maior parte das linhagens sequenciadas em dezembro foi de BQ.1.1, com 58 genomas (50% do total), e BQ.1, com 24 genomas (21% do total). Ambas são sublinhagens de BA.5 que estão sob monitoramento porque possuem mutações adicionais no genoma. Também houve detecção de BA.5, com 11 genomas (quase 10% do total). Esses dados são constantemente atualizados na página da Rede Genômica Fiocruz, incluindo os genomas sequenciados pela própria Rede e depositados na plataforma GISAID por outras instituições a partir de amostras brasileiras.
O Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do IOC é referência em vírus respiratórios para o Ministério da Saúde e em Covid-19 nas Américas para a Organização Mundial da Saúde (OMS). Também integra a Rede Genômica Fiocruz, que reúne pesquisadores de todas as unidades da Fiocruz no Brasil e de instituições parceiras para acompanhar a evolução do genoma do SARS-CoV-2. O que tem sido observado nos sequenciamentos realizados pelo grupo?
Desde o começo da pandemia, a Rede Genômica Fiocruz sequenciou mais de 68 mil genomas do coronavírus, sendo cerca de 30 mil decodificados pelo Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo. De novembro para cá, detectamos 487 casos de BA.5 e 1.189 casos de sublinhagens de BA.5 (incluindo BQ.1.1, BQ.1 e BF.7, que são subvariantes sob monitoramento). Além disso, identificamos 74 casos de BA.4.6 e 18 casos de XBB. Ambas também são subvariantes sob monitoramento.
Como é realizada a notificação das variantes encontradas? Quais autoridades são notificadas?
A notificação das novas linhagens detectadas no país é feita diretamente ao Ministério da Saúde, às secretarias estaduais de Saúde e Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Laces). Dentro do Ministério da Saúde, dois órgãos são notificados: a Coordenação Geral de Laboratórios (CGLab) e a Coordenação Geral da Gripe (CGGripe), que coordenam o monitoramento dessas variantes no país. Essa notificação é feita imediatamente após o sequenciamento genômico e análise dos dados. Além disso, nós depositamos as sequências genéticas decodificadas no banco de dados da plataforma internacional Gisaid, para compartilhamento de informações com a comunidade científica.
Até quando surgirão novas variantes do coronavírus?
Faz parte do processo natural de evolução do SARS-CoV-2 adquirir novas mutações para se adaptar à população. Enquanto o vírus circular em altas proporções, existe a possibilidade de surgimento de novas variantes. Por isso, o ideal é que a gente reduza ao máximo essa circulação, para que as chances de surgimento de uma nova variante, que pode ter maior impacto na dispersão da Covid-19, seja reduzida.
Qual a importância da vacinação no controle do surgimento de novas variantes?
A vacinação é fundamental pois contribui para o vírus circular menos e reduz a possibilidade de gravidade daqueles indivíduos infectados. As medidas não farmacológicas, como o uso de máscaras, também são importantes quando o indivíduo estiver exposto a aglomeração. Isso reduz a chance de transmissão e, consequentemente, o aumento da circulação viral, que eleva a possibilidade de emergência de novas variantes.
Edição: Vinicius Ferreira
(Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)